198 Livros: Ilhas Salomão – The Alternative

198 Livros As ilhas do Oceano Pacífico têm se mostrado os destinos mais difíceis até agora. Palau já foi sorteado há um bom tempo, mas ainda não consegui achar um único romance de lá, muito menos um traduzido para alguma das línguas que eu posso ler. Ilhas Salomão também deram trabalho. Até descobri alguns livros, mas a maioria não disponível comercialmente. O livro salomonense mais famoso parecia ser The Alternative, de John Saunana, mas não o encontrei em nenhuma livraria. Minhas pesquisas eram infrutíferas e o país foi sendo sempre realocado pro final da fila.

Um dia a Carla Portilho resolveu clicar no link do Google Books que dizia “Obter livro impresso”, um desses link que a gente nem pensa em abrir porque já acha que não vai da em nada, sabe? E não é que a nossa resposta estava lá? The Alternative é vendido pela editora da University of the South Pacific, a IPS Publications. O frete saiu mais caro do que o livro. Pudera! O caminho que ele percorreu até aqui não foi nada curto. Ele passou por dois aeroportos em Fiji, voou para Auckland, seguiu para Los Angeles, fez uma escala em São Paulo e, enfim, chegou às minhas mãos! The Alternative, John Saunana

The Alternative parece mais um conto. O livro é bem pequeno, daqueles que a gente começa a ler e tem que se segurar para não terminar em uma tarde. Ele conta a história de Maduru, um adolescente que saiu de sua vila ainda criança para estudar na escola britânica no período em que as Ilhas Salomão ainda eram um protetorado do Reino Unido. De certa forma, o crescimento de Maduru reflete o amadurecimento do país. No início, ele tem um sentimento de inferioridade típico das colônias. O colonizador tenta substituir a cultura local pela sua, impondo religião e hábitos, e passa a idéia de que é perfeito. Para Maduru, tudo relacionado aos europeus é bom e os costumes de sua vila são sempre piores e antiquados. Com os tempo, sua visão começa a mudar e os ideais libertários afloram. Alguns estudantes não aceitam mais as regras impostas dos professores e começam a lutar por seus direitos.  Maduru é um dos protagonistas de uma revolução estudantil que acaba trazendo consequências para seu futuro.

Vi algumas semelhanças nas histórias de Maduru e de Hampâté Bâ, o protagonista do livro malinense. Em ambos os casos, a educação dada pelos colonizadores, apesar de ser uma tentativa de imposição cultural, acabou formando adultos mais conscientes que posteriormente tiveram papéis importantes na independência dos países. Quando Maduru começa a aceitar sua cor e sua história, o sentimento nacionalista me lembrou também da postura de Amoah, o jovem do livro de Gana. Aos poucos, esse projeto de leitura está me ajudando a formar um bom panorama da história desses países. Eu não imaginava que existiam tantas colônias até recentemente e que as Ilhas Salomão, por exemplo, só se tornaram independentes em 1978. Como eu já disse outras vezes por aqui, a cada livro eu confirmo o tamanho da minha ignorância em relação ao mundo!

Ah! E se você, como eu, também não sabia nada sobre as Ilhas Salomão, faz uma busca rápida no Google por “Ilhas Salomão loiros” para se surpreender. ;-)

The Alternative foi publicado originalmente em inglês pela University of the South Pacific Solomon Islands Centre, em 1980.

Mais alguns livros de autores salomonenses:

  • The Confession and Other Stories, Julian Maka’a
  • Two Times Resurrection, Rexford Orotaloa
  • Suremada, Rexford Orotaloa

Saiba mais sobre o Projeto 198 Livros.

16 Comments

  1. Carla Portilho

    ***SPOILERS***

    Meninas, vou trazer pra cá alguns comentários que fiz no FB, só pra ficarem registrados aqui e não se perderem. Assim temos um ponto de partida se vocês quiserem conversar!

    Como eu tinha dito lá, no início da leitura eu achei o enredo muito parecido com o do Journey, de Gana. Aquele ambiente de uma escola britânica, os alunos nativos sendo “catequisados” para acreditar que a cultura do colonizador é superior à sua, a imposição do uso da língua inglesa (no caso) em detrimento das línguas locais, enfim, era tudo mesmo bem semelhante…

    Mas devo dizer que eu me surpreendi com Maduru… A princípio imaginei que ele continuaria aquele rapaz meio bobinho, um tanto quanto “vendido” aos ideais do colonizador, sem a menor percepção de que, por mais que abraçasse a cultura imperialista britânica, ele nunca seria parte dela… Quando se dá aquela reviravolta na história, com a greve dos alunos e ele se torna um líder político – a princípio apenas no ambiente estudantil, mas depois em um âmbito maior – ele toma um rumo completamente diferente do rumo que tomou Amoah, em Journey.

    Amoah viu que a educação não lhe abriria todas as portas, e que as dificuldades para sobreviver no mundo adulto seriam grandes. Maduru, por outro lado, vê que o fato de não ter concluído sua educação europeia não impede que ele seja capaz de lutar pelo seu povo – na verdade, o fato de ter tido contato com essa educação europeia significa que ele tem mais conhecimento do “inimigo” e pode, como nas artes marciais, usar a sua própria força contra ele.

    Existe um personagem shakespeariano, em A Tempestade, chamado Caliban, que é considerado pela crítica contemporânea como um símbolo dos povos colonizados. Em um determinado momento, Caliban diz que o melhor de ter aprendido a língua de Próspero (que simboliza o colonizador) é que agora ele pode usá-la para xingá-lo… Pensei em Calibán direto quando vi as atitudes de Maduru.

    Fui só jogando uns comentários soltos, meninas, antes que eu me envolva em outras leituras e acabe esquecendo. Tenho certeza que ainda vão aparecer outras ideias…

    Ah, o texto que eu encontrei (que está disponível em http://www.ariel.ucalgary.ca/ariel/index.php/ariel/article/viewFile/2839/2784) foca justamente no 2o. romance publicado nas Ilhas Salomão, que a Camila listou nas outras sugestões: Two Times Resurrection, de Rexford Orotaloa, embora fale um pouco sobre The Alternative também.

    • Carla, já tenho que reler meus posts para me lembrar de alguns detalhes dos livros. É que há muitas semelhanças entre alguns. No caso das Ilhas Salomão eu relaciono com Mali, Gana, Papua Nova Guiné, Comores… Todos países que se tornaram independentes recentemente. Alguns livros, como o das Ilhas Salomão, parecem refletir o amadurecimento do país. Com certeza não são todos os cidadãos que têm consciência da dominação cultural a que foram submetidos por isso foi muito interessante ver esse crescimento de Maduru.

      Gostei desse Caliban. ;-)

      • Carla Portilho

        Essa questão da consciência da dominação é interessante, né? Eu diria que a maioria dos cidadãos comuns não percebe essa dominação… O amadurecimento de Maduru (em português dá até pra brincar com as palavras…) é um amadurecimento político, que eu acho, sim, que simboliza o crescimento político do país, seu desejo de ser independente e de nortear sua própria história.

        Meus alunos também gostam de Caliban, rsrsrs…

    • Lu Malheiros

      Meninas,
      Vou ter que começar a fazer algumas anotações dos livros que já li! Já me esqueci de muitos detalhes; ainda bem que tenho as resenhas da Camila para me guiar :-)
      Essa questão da dominação cultural é um tema bem interessante. [Carla, voltei incomodada do México com a história da Malinche. Procurando um pouco mais sobre ela acabei esbarrando em um artigo seu da Revista Gragoatá. Gostei!]. Acabei de ler o livro do Panamá e, apesar deles não terem sido formalmente colonizados pelos americanos, a relação colonizado x colonizador ou , sei lá, oprimido x opressor é forte no livro. Depois, tento fazer uma pequeníssima resenha do livro.

      • Carla Portilho

        Lu, eu nem me lembrava mais que tinha publicado sobre a Malinche na Gragoatá, rsrsrs… Sou fascinada pela história dela!

        • Carla Portilho

          Ah, já sei… Foi numa Gragoatá recente! Nesse artigo tem pouca coisa sobre ela… Se você quiser algo mais, Lu, te mando o pdf da minha dissertação de mestrado – tem bastante coisa sobre a Malinche!

      • Meninas, vocês estão me deixando curiosa com essa história da Malinche! Nunca tinha ouvido falar! Mas acho que vou deixar pra pensar nisso quando chegar a vez do México! ;-)

    • Realmente, eh uma constante essa abordagem da dominação cultural feita pela maioria dos escritores de países que tiveram sua independência declarada recentemente. Acho que o diferencial de Maduru, em relação aos outros, é a sua personalidade. Ele se envolve completamente em tudo que faz. Já no inicio quando se revolta com a professora e quase é expulso. A gente não consegue ficar indiferente a ele. No início não conseguia deixar de pensar: “Que menino chato!” Mas com o amadurecimento ele muda o foco, e parte para a ação! E a gente se vê torcendo por ele! Também me surpreendi Carla!

      • Carla Portilho

        Essa dominação cultural é uma característica bem forte da colonização imperialista, Ana – por isso a gente vê a literatura dos países que ficaram independentes recentemente batendo tanto nessa tecla… Não bastasse o colonizador se impor política e economicamente, ainda se fez de tudo para esmagar a cultura e a língua locais…

  2. Carla Portilho

    Eu cliquei naquele link com essa exata sensação de que não ia dar em nada mesmo… Nem acreditei quando vi o livro disponível, mesmo o frete sendo mais caro do que o produto! Mas estou esperando o meu chegar até hoje…

  3. Wanessa Lima

    Camila, eu também tomei um susto com esses habitantes loiros da Ilhas Salomão! Achei curiosissimo!

    • Wanessa, quando vi as fotos me lembrei de já ter lido sobre isso, mas sabe que quando sorteei as Ilhas Salomão eu nem me toquei que era o mesmo lugar? É muito interessante, né? O mundo é muito diverso!

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