198 Livros: Zimbábue – Shadows

198 Livros - Zimbábue A literatura africana contemporânea está com tudo! A maioria dos livros africanos que li até agora me surpreenderam positivamente. O período logo após a independência de algumas dezenas de países foi muito rico para a área cultural e agora há uma nova geração que cresceu já no pós-colonialismo e que está fazendo bonito. Um exemplo disso é o projeto Africa39, que selecionou 39 escritores com menos de 40 anos considerados os mais promissores da África subsaariana. Na lista estão Ondjaki, o autor que representou Angola, e Chimamanda Ngozi Adichie, a escritora nigeriana. Foi lá também que eu descobri Novuyo Rosa Tshuma e seu livro de estreia, Shadows, o escolhido do Zimbábue para o #198livros.

Shadows reúne num só livro um romance e cinco contos. Os enredos transitam entre Bulawayo, uma das maiores cidades do Zimbábue, e Joanesburgo, para onde quase todos os zimbabuanos querem fugir. O mais longo deles, o romance que empresta o nome ao livro, tem como protagonista Mpho, um jovem artista em eterno conflito com a própria vida e com a sociedade. Mpho vive com a mãe e depende financeiramente dela, mas não aceita sua profissão. Ela é prostituta, mas sabemos que no início ela trabalhava como empregada doméstica em casa de “negros que se consideram brancos”. Mpho se ressente por não saber quem é seu pai e por imaginar que ela também não saiba. Mas quando a mãe adoece – e também quando ele precisa lidar com a precariedade da saúde pública de seu país – é que seu mundo começa a desmoronar. A vida de Mpho então toma um rumo totalmente inesperado. Shadows - Novuyo Rosa Tshuma

Nos contos e no romance alguns temas se repetem. As filas constantes para garantir direitos básicos, o desrespeito às mulheres, humilhações, corrupção e abusos policiais parecem fazer parte da vida dos zimbabuanos mais pobres. A sociedade está falida e não encontra apoio na ditadura que há décadas domina o país. Cada um precisa encontrar a sua forma de sobreviver em meio ao caos que ronda a vida de todos e à instabilidade política. Se a falta de energia, de água e de produtos são comuns, se o desemprego é alto, se banheiros dentro de casa são um luxo e se é preciso até mesmo comprar os materiais que serão usados no hospital, é fácil entender porque as pessoas querem fugir para um lugar melhor, nesse caso a África do Sul. Mas esse sonho na maioria das vezes é realizado às custas da ilegalidade, sempre acompanhada pelo preconceito e pela saudade de casa. Partir ou ficar, qual a melhor solução para a população do Zimbábue?

As histórias de Shadows são contadas de forma tão forte e crua que é até difícil acreditar que Novuyo Rosa Tshuma tinha apenas 25 anos quando o livro foi publicado. É preciso ter muita maturidade para lidar com dores tão fortes e conseguir fazer isso de forma que a leitura ainda seja boa não é para qualquer um. Deve ser por isso que ela foi escolhida como uma das revelações da literatura africana que prometem. É triste pensar que sua prosa talvez retrate a realidade do Zimbábue, pois o cenário que ela descreve é chocante. Por isso a função desses novos escritores que expõem brutalmente os problemas de seus países é importante, afinal, não só o que é belo merece ser mostrado ao mundo.

Shadows foi publicado originalmente em inglês, em 2013, pela Kwela Books.

Mais livros de autores do Zimbábue:

  • Precisamos de Novos Nomes, Noviolet Bulawayo
  • The No. 1 Ladies’ Detective Agency, Alexander McCall Smith
  • This Mournable Body, Tsitsi Dangarembga
  • Through the Darkness, Judith Todd

Saiba mais sobre o Projeto 198 Livros.

8 Comments

  1. Lucimara Busch

    Oi Camila! Eu quis conhecer o romance de estreia da escritora NoViolet Bulawayo e li “Precisamos de Novos Nomes”. Adorei! Gostei dela, dos personagens e da história. Os nomes dos personagens trouxeram Ondjaki à minha mente, e eu sou apaixonada por ele, então, eu curti muito a leitura. Esses países africanos sempre me encantam!

  2. Marina Vidigal Brandileone

    Tô na metade do livro e estou adorando. Forte, duro é muito mais parecido com o Brasil do que eu imaginava. O lado machista me espetou forte! Que dureza!

    • É pesado, né Marina? Mas é também muito real, o que torna tudo ainda mais triste. E também acho que há muitas semelhanças com a realidade brasileira. :-(

  3. Preciso comprar um Kindle. Tive a infelicidade de comprar um e-reader da Sony – tenho uma certa fobia de monopólio, principalmente eletrônico – mas eu me arrependi.

    Eu acho interessante essa questão envolvendo os países africanos subsaarianos, pós regime segregacional. O Imperialismo e o Apartheid foram cânceres que, no meu ponto de vista, fulminaram a possibilidade de esses países se desenvolverem. A falta de acesso à educação da maioria negra deixou como mazela a diminuta possibilidade desses povos terem bons governantes.

    Você já viu o documentário do Louis Theroux “Law and Disorder in Johannesburg”? Dá para notar que a situação já bastante caótica da África do Sul é bastante piorada por conta da imigração ilegal.

    Vou ver se acho esse livro em formato ePub.

    O seu blog é muito legal.

    • André, acho que você poderia embarcar no #198livros! ;-)

      • Tenho vontade, apesar de que a minha pilha de livros na fila de leitura é imensa. Sou um leitor assíduo e voraz, mas não necessariamente leio rápido.

        Preciso antes de tudo comprar um Kindle. O seu é 3G ou é só WI-FI. Queria comprar o 3G, mas não sei se é útil…

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.