198 Livros: Barein – Yummah

198 Livros - Barein
Não sei onde foi que vi a primeira referência ao livro Yummah, da escritora bareinita Sarah A. Al Shafei. Só sei que tem tempo, foi lá no inicinho do Projeto 198 Livros, em 2013. Eu sabia que não seria fácil encontrar um livro do Barein, então quando ouvi falar de Yummah corri e garanti meu exemplar na Book Depository. Ele passou anos na estante aguardando ser sorteado, mas a única prejudicada com essa demora fui eu. Por que eu não li esse livro antes? Quando enfim chegou a vez dele, eu não queria desgrudar os olhos de suas páginas!

Yummah conta a história de Khadeeja, uma garota que aos 12 anos é obrigada a se casar com um homem bem mais velho que ela. O pai nasceu antes mesmo dela nascer, os irmãos mais velhos já estão casados e a mãe está doente. Não dá para julgar essa mãe, que quer ver o futuro da filha garantido antes de morrer. E que outra garantia a filha poderia ter vivendo no Barein no início do século passado? E assim a pequena Khadeeja, que não passa de uma criança que não quer se separar de sua mãe e de suas bonecas, se casa com Mohammed. Ele é enfermeiro, trabalha no único hospital do Barein, mas tem status de médico por ali, é um excelente partido.

É triste perceber que na maioria dos livros de países muçulmanos que tenho lido a história das mulheres se repete. O enredo sempre engloba casamentos forçados, uma vida de privações e a quase ausência de direitos. É claro que nessas histórias o homem também se submete ao casamento arranjado, mas a diferença é que ele não é obrigado a se casar e geralmente não é uma criança quando isso acontece. Mas o casamento de Khadeeja a princípio não é um evento triste. Logo no primeiro dia ela se apaixona por Mohammed. E como não se apaixonaria? É a primeira vez que ela tem contato próximo com um homem e ele é gentil com ela. Naquela noite a menina de 12 anos sente que virou mulher, mas no dia seguinte ainda é a criança que quer fazer confidências à boneca Layla, sua melhor amiga por toda a vida.

Yummah - Sarah A. Al Shafei

Esse é só o início da vida de Khadeeja. Yummah tem menos de 200 páginas, mas elas conseguem condensar muita história. Dos 12 aos 23 anos Khadeeja engravida mais de 10 vezes. 9 filhos sobrevivem. A mais velha também se casa nova como ela, mas a realidade mudou bastante em apenas uma geração. As mulheres agora vão à escola, apesar de ainda pararem de estudar quando se casam. Um pouco depois, provavelmente na década de 50, as mulheres começam a trabalhar.

“Fatima was among the first women who worked in Bahrain, and even though the society attacked them fiercely at first they soon accepted and respected.”

A independência do Barein do domínio britânico chega em 1971 e traz uma onda de modernidade. A gente acompanha não só as mudanças na vida de Khadeeja e de sua família,  mas também na sociedade do Barein. A passagem do tempo é marcada principalmente através de casamentos, que se sucedem um atrás do outro. E assim vemos o Kwait ser invadido pelo Iraque e causar inflação e falta de comida no Barein, vemos o país ser coberto pela fumaça da queima de petróleo no país vizinho, vemos a chegada do exército americano. A história do Barein no século XX se descortina aos olhos do leitor de Yummah.

“We silently grieved for the people. We grieved for Islam. And we grieved for the unity of the Arabs that will never return to our region.”

Não sei nem porque esse livro me emocionou tanto. Não foi a curiosidade pelo destino dos personagens, pois o resumo na capa do livro conta praticamente todos os fatos mais importantes, que eu preferi não abordar aqui. Acho que foi a sensibilidade de Sarah A. Al Shafei ao narrar essa história, que parece ser também a sua. Não consegui confirmar essa informação, mas terminei o livro acreditando que Khadeeja é a avó de Sarah.  Se isso for verdade, ela conseguiu fazer uma linda homenagem à sua família e a seu país de origem.

Yummah foi publicado originalmente em inglês, em 2005, pela editora Athena Press.

Saiba mais sobre o Projeto 198 Livros.

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