198 Livros: Uruguai – Deixa Comigo

198 Livros - Uruguai Eu queria que a minha leitura do Uruguai fosse especial. É que ele tem um lugarzinho reservado no meu coração. Foi lá que eu pisei pela primeira vez em solo estrangeiro, numa viagem de carro saindo de Uberlândia há 8 anos. Os uruguaios nos receberam tão bem que um tempo depois voltamos. O país tinha mudado. Ele estava mais caro, havia menos carros antigos e mais turistas nas ruas, mas continuava encantador. Muita gente nem imagina que aqui do ladinho há um país tão seguro e um povo tão educado. E ainda por cima cheio de belezas naturais e históricas. Só de me lembrar de Colonia del Sacramento eu já morro de vontade de voltar!

Eu esperava que o livro do Uruguai refletisse essa atmosfera, mas não foi muito fácil achar o que eu procurava. Não é que eu não tenha encontrado livros de autores uruguaios. Encontrei sim, mas não tantos quanto eu desejava. Em versão digital não descobri quase nada e o frete para comprar algo das livrarias uruguaias ou argentinas era espantoso, aí só sobraram as traduções. Eu já tinha lido A Trégua, de Mario Benedetti, e queria algo diferente.  A escolha acabou sendo até fácil: dava para contar as opções nos dedos! Felizmente todas pareciam boas, mas a busca era por um que representasse um pouco da cultura uruguaia, então apostamos no Deixa Comigo, de Mario Levrero. Deixa Comigo - Mario Levrero

Deixa Comigo é um misto de suspense, humor e fantasia. O livro é narrado por um escritor que ainda não se recuperou do divórcio mais ou menos recente e que precisa desesperadamente de dinheiro. Ele tenta publicar seu último romance, mas a editora o rejeita. Ele mesmo não parece muito convencido da qualidade de sua obra. Se fosse boa mesmo ele a levava aos espanhóis, ou pelo menos aos argentinos! Mas a editora tem outra proposta para ele. Há poucos tempo havia chegado um envelope sem remetente e lá dentro um curto romance escrito à mão e assinado por um desconhecido Juan Pérez. O livro era dos bons! Os suecos estavam enlouquecidos com ele! O problema é que a editora não havia conseguido localizar o autor. Seu trabalho seria ir até a pequena cidade de Penurias, de onde a carta havia sido enviada, e descobrir quem se escondia sob o pseudônimo Juan Pérez. Não era um trabalho digno para ele, mas a necessidade falou mais alto. Ali não existia a profissão de escritor e eles eram obrigados a fazer qualquer coisa para sobreviver.

“Pareceu-me um trabalho fácil: comprar uma passagem para Penurias – uma hora e meia de viagem, aproximadamente –, descer do ônibus na estação, parar na principal e única avenida – seguramente deve se chamar Artigas –, e perguntar por Juan Pérez aos amáveis pedestres.”

Então nosso escritor pega um ônibus para a pequenina Penurias, vizinha de Miserias e de Desgracias. Ele desce na cidade que parece fantasma (cuja rua principal realmente se chama Artigas) e se dirige ao único hotel para logo começar suas buscas por Juan Pérez. A investigação se mostra mais difícil do que ele imaginava e no percurso de sua pequena jornada ele cruza com personagens bastante peculiares.

Deixa Comigo tem uma linguagem super fluida e, pelo seu tamanho, é mesmo uma novelinha, como o autor a descreve na dedicatória do livro. Talvez ela possa ser chamada também de um conto mais longo. Daria para ler numa só sentada e eu só não fiz isso porque comecei nas vésperas de embarcar para os Balcãs e deixei o livro em casa.

Complementando o romance faz também parte do livro a “Entrevista imaginária com Mario Levrero, por Mario Levrero”, recheada de tamanho mau humor que a torna engraçada. O livro não me mostrou o Uruguai da forma que eu gostaria, mas a leitura foi deliciosa. Fiquei feliz por ter descoberto um escritor que de outra forma eu provavelmente não leria.

Deixa Comigo foi publicado originalmente em 1998, em espanhol, e no Brasil em 2013, pela Editora Rocco. A tradução é de Joca Reiners Terron.

Mais alguns livros de escritores uruguaios:

  • A Trégua – Mario Benedetti
  • Um, Dois e Já – Inés Bortagaray
  • O Cavalo perdido – Felisberto Hernández
  • A vida breve – Juan Carlos Onetti
  • Parir. – Andrés Ressia

Saiba mais sobre o Projeto 198 Livros.

 

10 Comments

  1. Pequenos países,com elevadíssimo índice de formação educacional,costumam ser pródigos em excelentes escritores. O Uruguai é um exemplo.Recomendo-lhe Horácio Quiroga,escritor uruguaio que se radicou na Argentina,onde fez carreira.Um outro exemplo: a Irlanda. Também, a Escócia. Tudo aquilo que você pensa ser grande literatura inglesa é,na verdade, frequentemente irlandesa ou escocesa.A razão é simples: existe demanda exigente,público,nesses países menores.Talvez,não tão numeroso como pudesse ser no Brasil.Mas, superiormente mais qualificado. No caso dos hispânicos,há ainda um outro aspecto: as editoras espanholas e latino-americanas não enfrentam as barreiras ultranacionais que os países lusófonos impõem uns ao outros;em particular, Brasil e Portugal.O que aumenta a comunidade de leitores e reduz o preço do livro (físico ou digital). Caso goste de poesia, encontrará excelentes poetas uruguaios,também. E não só o muito lido e conhecido Mario Benedetti, como ainda Delmira Agustini e Idea Vilariño . Não se mede a grandeza de uma sociedade ou de um país com base em nossa própria ignorância.Deveríamos dar mais conta de nossa ignorância,dando-nos mais a saber dela, que nada dar pelos outros, pelas sociedades,pelos povos,pelos concidadãos de outras regiões,etc. Um abraço fraterno! Boas leituras.

    • Na primeira vez que fui ao Uruguai fiquei espantada com o tanto de gente lendo nas ruas, parques e praças. Os uruguaios sempre me pareceram muito educados e cultos. Ainda temos um longo caminho a percorrer aqui para disseminar o hábito da leitura.

  2. Daniela Moraes

    Camila,
    O Uruguai também foi o primeiro lugar que visitei fora do pais e fui de ônibus…rsrs…
    Gostei do livro..fiquei interessada…

    • Daniela, é uma delícia ler livros de lugares desconhecidos, mas revisitar os conhecidos através da literatura também é ótimo! Você também adorou o Uruguai?

      • Daniela Moraes

        Eu adorei !!!! E o melhor foi que me surpreendeu porque eu não dava nada pelo Uruguai…

  3. Lucimara Busch

    Camila, mais tarde quero ler outro do Uruguai, pois esse não me encantou :(

    • E de qual país a gente não quer ler mais um Lucimara? rsrs Como eu disse, esse não foi o que eu procurava, mas gostei. Queria ter lido algo que mostrasse mais a cultura uruguaia, mas dos que encontramos nenhum me pareceu seu assim. Continuemos as buscas no futuro!

      • Lucimara Busch

        ahaha a gente sempre se apaixona pelos autores né? Nesse caso, comigo foi o oposto, e só quero mais sobre o país. Com calma, encontraremos outro. Até agora quero substituir esse, e Noruega. Acho que só esses dois!

  4. Tem também o Eduardo Galeano, autor do “O Livro dos Abraços” e “As Veias Abertas da América Latina”. Pra mim, ele é um dos melhores escritores Latino americanos.
    Abraços!

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