198 Livros: Iraque – The Baghdad Clock

198 Livros - IraqueAs imagens da Guerra do Golfo transmitidas pela televisão fazem parte das minhas primeiras lembranças da infância. Elas me impressionaram muito na época e desde então eu sempre associei o nome do Iraque à ideia de guerra, ate o ponto de ficar insensível a ele. A leitura de The Baghdad Clock, da escritora iraquiana Shahad Al Rawi, me lembrou de que, por trás das notícias, por mais repetitivas que sejam, sempre há vidas sendo afetadas. Ainda bem que há pessoas dispostas a contá-las.

The Baghdad Clock é um romance que mistura realidade e ficção ao narrar a vida de uma geração que cresceu em meio à guerra, como a própria autora. Shahad Al Rawi nasceu em 1986 e imagino que a narradora de seu livro tenha mais ou menos a mesma idade, pois suas primeiras lembranças também parecem ser da Guerra do Golfo, quando ela conheceu sua melhor amiga, Nadia.

“We spent more than twenty nights in the shelter, that January in 1991 when the Baghdad sky blazed with planes and rockets. And during those long weeks we lived through fear, cold and hunger, sharing our hopes and dreams. We did not know at the time what was happening around us. We did not understand then what the war meant.”

The Baghdad Clock - Shahad Al RawiEssa seria apenas uma parte triste da história das garotas, caso nos anos seguintes o Iraque não continuasse sofrendo com guerras e com as sanções impostas pelo Conselho de segurança da ONU, que duraram de 1990 a 2003. Acho que a gente não costuma pensar muito no impacto que as sanções comerciais causam nos países que as sofrem. Imaginem as prateleiras dos supermercados quase vazias, as ruas cheias de buracos, os carros cada dia mais velhos e as roupas sendo remendadas infinitamente. Sem falar em remédios e outros insumos médicos e científicos.

“The sanctions were a slow death we lived through minute by minute. The sanctions were not only a weapon to make us starve, they largely put an end to our way of living and destroyed the meaning of life. They stole away the spirit of hope, and when hope disappears, life becomes merely a routine in which we move from one miserable day to another yet more miserable.”

Apesar de tudo, a vida encontra seus meios de seguir em frente. Ela precisa encontrar. As garotas crescem, estudam, se divertem como podem. Ao mesmo tempo, elas veem a vizinhança ficar cada dia mais vazia à medida em que as pessoas emigram. E então, em resposta aos ataques de 11 de setembro de 2001, bombas caem novamente sobre Bagdá. Foi como se o inferno as alcançasse novamente.

“Is there anything uglier than war? How ugly is this world that understands itself through wars and blockades! What does civilisation mean when we starve children and adults and then launch missiles at them? What does it mean for humanity to progress when it keeps inventing ever more hideous paths to mutual annihilation?”

The Baghdad Clock é um romance muito bonito que, assim como outros livros escritos por autores em exílio, é uma espécie de homenagem ao mundo que eles um dia conheceram e foram obrigados a abandonar. Ele conta a história de uma amizade, mas também de uma vizinhança e de uma cidade. Como sempre, ele me fez pensar no quão absurdas são todas as guerras.

Em certo momento a narradora fala da importância dos livros para ajudá-la a enfrentar os momentos difíceis e cita Cem Anos de Solidão, do Gabriel García Márquez. Com certeza essa foi uma das inspirações da autora para a inserção de um pouco de magia em seu livro de estreia. Foi uma ótima influência.

The Baghdad Clock foi publicado originalmente em árabe, em 2016, e em inglês em 2018, pela Oneworld Publications. A tradução é de Luke Leafgren.

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2 Comments

  1. Cristiane Xerez

    Nossa! Espero que em breve tenhamos uma versão em português. Muito obrigada, Camila, por compartilhar sua experiência de leitura conosco.

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