198 Livros: Suriname – The Cost of Sugar

198 Livros - SurinameFeliz o dia em que eu inventei de embarcar nessa jornada literária! Sempre que alguém me diz que está com vontade de fazer o mesmo eu dou o maior apoio. Não consigo explicar o quanto essa volta ao mundo em livros está sendo transformadora. Lendo livros de países que antes eu nem sabia apontar no mapa eu descobri o tamanho da minha ignorância em relação ao mundo. E de que outra forma eu teria colocado minhas mãos no fantástico The Cost of Sugar, da escritora surinamense Cynthia McLeod? Esse projeto não para de me surpreender!

The Cost of Sugar retrata a história do Suriname no século XVIII, entre 1765 e 1779, através da vida de uma rica família judia, especialmente de Elza e Sarith, criadas como irmãs desde que seus pais se casaram. Na verdade apenas Sarith é judia. A mãe de Elza não era judia e, consequentemente, ela também não é. As duas se dão bem, mas são muito diferentes. Elza é simples e discreta, Sarith é vaidosa e ousada. O destino das jovens já seria suficiente para prender minha atenção do início ao fim desse livro, mas Cynthia McLeod usa essa história como pano de fundo para mostrar um cenário muito mais amplo.

No século XVIII o Suriname era uma colônia holandesa e sua economia se baseava principalmente na plantação de cana de açúcar às custas de mão de obra escrava. The Cost of Sugar - Cynthia Mc LeodOs escravocratas defendiam que os negros haviam sido criados por Deus apenas para servir aos brancos. É um pensamento absurdo e revoltante, mas acredito que era realmente a desculpa que muitos brancos usavam naquela época. Cynthia McLeod explora esse assunto através da postura de diferentes personagens.

Os fazendeiros vivem com medo dos Maroons, grupos de escravos fugidos que agora atacam as fazendas matando os brancos donos das terras e libertando os escravos. Rutger é um jovem recém chegado da Europa. Ele defende que os escravos deveriam ser tratados bem. Não seriam as graves punições e os maus-tratos a causa das rebeliões? Por que os escravos eram proibidos até mesmo de calçar sapatos? Mas ele é visto como ingênuo, um jovem idealista que não entende como as coisas funcionavam na colônia. Ele ainda não percebeu que os brancos são totalmente dependentes dos negros e precisam manter o odioso regime escravocrata para se conservarem no poder.

Além da questão dos escravos, daria para falar muito sobre a situação da mulher descrita em The cost of sugar. Quase todos os homens tinham uma amante negra para “satisfazer suas necessidades”, sem que eles tivessem nenhuma responsabilidade em relação a elas. Se nascesse um filho dessas relações, bastava uma pequena ajuda financeira e pronto, problema resolvido. As mulheres brancas aceitavam esses casos, era algo normal. A resposta de um noivo pouco antes do casamento quando a noiva pergunta se ele planeja ter uma amante ilustra o absurdo dessa situação:

“Oh no, but you never know how life goes, and I want you to know that I will always remain true to you, even if, for instance, I have a brief something or a short affair with another woman. Do you understand that? Promise that you won’t be angry or think that you must have your revenge with another man.”

O livro é contado pela perspectiva da comunidade judaica, que parece ter tido uma grande presença na fundação da colônia no Suriname, mas naquele momento há um certo preconceito em relação a eles. É até cômico ver Sarith questionar esse preconceito em certo momento. Contra os judeus – brancos como os cristãos ricos – a discriminação é absurda, mas a forma de tratar os negros é normal. Ah, essa igualdade seletiva…

“Many well-to-do Christian plantation owners wanted as little as possible to do with Jews, as if they were an inferior type of person. Ridiculous: they were all whites, after all!”

O nome do livro já diz muito: The cost of sugar. Será que os europeus que consumiam os produtos vindo das colônias imaginavam quantas dores e injustiças esses produtos carregavam? Será que os holandeses percebiam de onde vinha o dinheiro que construía casarões nos canais de Amsterdã? E hoje, será que não ocorre algo parecido? Ao consumir um produto, questionamos sua cadeia de produção? Pensamos na mão de obra, na exploração, na escravidão moderna? Felizmente esse tema está sendo cada vez mais discutido, mas ainda está longe de ser uma preocupação de todos.

É até difícil enumerar todas as reflexões que The Cost of Sugar me trouxe sobre colonialismo, escravidão, consumo, situação da mulher… É muita coisa! E no meio de tudo isso um grande romance, com momentos de alegria e de tristeza. Sem dúvidas um livrão! E um best-seller no Suriname, sabia?

The Cost of Sugar foi publicado originalmente em holandês, em 1987, e em inglês em 2007. A tradução é de Gerald Mettam.

Saiba mais sobre o Projeto 198 Livros.

4 Comments

  1. Pingback: The Cost of Sugar, de Cynthia McLeod [Suriname] [Legendi Mundi]

  2. Acabei de conhecer o seu blog. Que legal o que você está fazendo. Você já viu o vídeo do ted talk da mulher que fez o mesmo projeto? Eu o vi tem pouco tempo e desde então estou empeada estudando mais inglês, por que infelizmente é muito raro livros de outros países que não sejam dos estados unidos e companhia serem traduzidos para português.

    • Flora, você fala da Ann Morgan, né? Pois foi ela que me inspirou a fazer esse projeto! Quando eu ouvi falar pela primeira vez do que ela fez me decidi na hora. Na semana seguinte eu já estava começando minha volta ao mundo dos livros! (Contei sobre isso aqui: https://www.viaggiando.com.br/2013/07/uma-volta-ao-mundo-dos-livros.html) Realmente tem que ler em inglês para completar essa jornada. Acho que em português a gente não conseguiria ler nem metade do mundo. =(

      • Sim, tenho quase certeza que é ela. Pretendo agora aprimorar meu inglês e começar com livros mais fáceis e depois embarco nessa aventura.

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